segunda-feira, 29 de abril de 2013

É domingo, e o Maraca não é mais nosso...


No fim de semana o Maracanã reabriu.

Depois de 3 anos em obras, depois de drenar dinheiro público suficiente para transformar o Rio em Mônaco, o estádio mais famoso do país reabre, e será privatizado.



Há, em linhas gerais, duas formas de se ver o Estado. A primeira é a visão de um “Estado mínimo”, o que significa na prática pouca regulamentação, principalmente com relação às atividades econômicas. Além disso, defende-se que o Estado deva ser enxuto e não oneroso. Devemos pagar menos impostos e receber menos serviços. “Enxuga-se” o Estado entregando sua administração à iniciativa privada, regida pela natural maximização de lucros. É o caso das OS’s , por exemplo.

Outro grupo defende um Estado de caráter mais social. Ou seja, que Estados tem natureza e função diferentes de empresas e devem, por isso, ser regidos por outra lógica. Devem primar pelo bem público. Responsável, em última instância, por garantir condições básicas de vida aos cidadãos. São perspectivas de Estado em que o bem estar social está acima dos demais princípios. O Estado existe “por” e “para” o cidadão.

São apenas formas opostas de pensar, cada uma com seu mérito. O radicalismo é exatamente o que nos cega nessas questões. É preciso saber ouvir, apurar as boas ideias de cada modelo, refletir, adaptar...

Voltando ao Maracanã, a realidade é que não se pratica nem uma política liberal, nem de viés social. Pratica-se uma junção torta em que o Estado protege o grande capital. Gastamos fortunas dignas da Arábia Saudita para reformar um estádio, que no fim das contas ficará menor, e o entregamos a um consórcio de multinacionais que cobrarão muito mais caro por um bem cultural nosso e reformado com o nosso dinheiro.  Que te parece?

Enquanto essa manobra foi armada havia muita gente lutando para que as coisas não tomassem, novamente, esse rumo. Mas eram poucas vozes se comparadas às que gritaram um dia “O Maraca é nosso!”. Onde estão os torcedores que dizem amar o futebol? Que dizem que futebol é “religião”?  Que se orgulham da cultura “boleira” da cidade, do país? É esse Maracanã que querem? Cadê os "apaixonados" pela camisa, pelo Rio e seus símbolos? Calaram-se as vozes que bradavam os gritos de torcida? Reclamarão depois dos contratos assinados?

É até compreensível, embora eu discorde, que se defenda uma posição em prol da privatização, mas não, nunca, nesses termos.  Sem qualquer contrapartida. Fui duas vezes ao Maracanã. As chances de que eu vá de novo são ínfimas, salvo alguma “revolução” à la  Pinochet. Sempre defendi que o futebol trazia problemas não só para o Brasil, mas também para a integração latino-americana. Mas essa negociata me incomoda, pois se dá à custa do nosso dinheiro.  

A Fifa já impediu as baianas da Fonte Nova e o São João de Salvador. Mexeu na lei da “meia-entrada”, o Mineirão na estreia foi um desastre e não foi o único, o Engenhão fechado,  e todo mundo ligado na tabela do brasileirão... Sempre achei que quando violassem o “Pão e Circo” de verdade, o povo se mexeria mais. Bom, o circo já pegou fogo... os cariocas continuarão no bar assistindo o jogo...
Agora, do lado de fora. 

Com a palavra, Lúcio de Castro (ESPN), que entende muito mais de Maraca e de futebol do que eu, e que esteve na reinauguração da nova "arena", nada monumental, igual a todas as outras e para poucos...

http://www.espn.com.br/post/326086_mataram-meu-maracana-podem-chamar-de-estadio-justo-verissimo


sábado, 20 de abril de 2013

Voto obrigatório



No Brasil todos são obrigados a votar. No entanto, parece ter sido incorporada pelo senso comum, a ideia de que um dos problemas na política nacional é a compulsoriedade do voto. Defende-se, hoje, de forma bem ampla, que uma vez que o voto não fosse uma obrigação, só haveria votos conscientes. Mas será que essa tese se aplica ao Brasil?

Mesmo o voto sendo constitucionalmente obrigatório, há flexibilidade. Há a possibilidade de justificá-lo ou anulá-lo.  Justificar exige um trabalho maior, claro. Mas anular o voto nos casos de total descrença, protesto, ou insatisfação com as opções disponíveis, é muito fácil.

Os descrentes, de modo geral, são os mais alienados. Usam a descrença como desculpa para sua alienação. Quem não acompanha nada só vê o escândalo na TV. Político que trabalha e não rouba não aparece na mídia.  Não seria justamente quem pensa que ninguém na política tem caráter o primeiro a fiscalizar? Não deveria se envolver? Quem desconfia de um funcionário não o acompanha mais de perto?

O voto nulo pode até ser um protesto, uma vez que, representa em números a insatisfação do cidadão. Mas qual o efeito desse protesto? Qual a consequência?  Os maus políticos fazem a festa! Se não estão nem aí para a população, tampouco estão ligando se os eleitores estão ou não satisfeitos. Sempre terá um miserável disposto a trocar seu voto por comida. Se por ventura conseguíssemos a maioria de nulos, invalidando a eleição, gastaríamos mais dinheiro para fazer outra. E aí? Dessa vez faz o que? Vota em alguém? Anula tudo de novo? Até quando? Melhor tomar coragem e fazer logo uma revolução!

Mas há o voto nulo consciente, quando numa ou noutra eleição específica, diante das opções disponíveis, o eleitor decide anular. Aí, é legítimo.

Por ser obrigatório, as pessoas decidem não anular? Se isso acontece, a não obrigatoriedade não acabaria “selecionando” como eleitores somente aqueles que votariam em troca de algo? Mesmo que isso não acontecesse, se nenhum político é ético, como muitos vociferam por aí, para quem seriam esses tais votos conscientes?

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Quem vaia, muitas vezes, amigo é...


Acabo de ver o post do Chacal sobre a vaia que levou no Circo Voador.  Alguém comentou que “vaia faz parte da vida do artista”, e eu endosso dizendo: Já diria Lucinha Lins! Já vaiei e vaiaria de novo algumas pessoas. Não me lembro de ter vaiado artistas, mas já vaiei muito político em debate, confesso! Muito concorrente de chapa e, até amigos, em plenárias.

Saindo do mérito da justiça ou deseducação da vaia em si, e analisando o caso do Chacal, a vaia é justamente pela admiração. Esperamos atitudes inteligentes e éticas daqueles que admiramos pela inteligência e pela coragem de publicamente não compactuar com algumas coisas.

Também tenho sentimentos e opiniões dúbias sobre o “patrulhamento”. Por um lado é um saco, por outro, produz uma sociedade, no mínimo menos irritante. Uma série de temas de patrulhamento, são benéficos quando vão ao encontro da garantia de direitos. Não seria esse o caso do racismo e da homofobia? Nesses casos, o não patrulhamento é omissão, não?

Essa eleição foi diferente em muitos sentidos. Pela primeira vez tínhamos uma opção real de mudança, mesmo que não fosse a que você desejou.  A menos que seja um empresário do porte do dono da Delta e que, portanto, vive alienado da realidade da cidade,  qualquer apoio a essa prefeitura é apologia ao crime. Às milícias, às remoções, às demolições, aos aumentos extorsivos de impostos, ao total desrespeito aos Direitos Humanos, à vida quando mata e põe a culpa no trabalhador como no caso do bondinho (melhor nem falar em Sta Teresa, que já foi palco de tantas iniciativas culturais, hoje proibidas)... a “ficha corrida” dessa prefeitura é extensa!

Na minha opinião, esse tipo de patrulhamento entra na galeria do patrulhamento aos racistas ou homofóbos. É simplesmente inaceitável, justamente por vivermos numa democracia (ignorada por nosso autoritário prefeito, que até já declarou seus desejos de vitaliciedade, tão caro ao Senado Imperial que já abrigamos na cidade)

Caro, Chacal! Vc sempre foi um ídolo dos jovens cariocas... Fez escola, cara! O CEP 20000 deixei de frequentar quando foi para o Sérgio Porto, (que acho um caixote inóspito), mas segui acompanhando suas peripécias culturais de longe. Mas nessa você mandou MUITO mal, e a vaia serve de puxão de orelha do teu público. Forma genuína de expressão popular num caso desses. Talvez, não fosse a falta de saco do cidadão para ler notícias inteiras, ou a falta de memória (que alguém mencionou como algo positivo num comentário ao post), a vaia não tivesse acontecido. Mas, certamente haveria um circo mais vazio... Sinais de menos pão, e menos circo na nação?

 A impressão que dá é de que algumas pessoas nem leram o que assinaram. Você viu o que o famigerado manifesto falava sobre a saúde e educação?! Como professora, ainda que da rede particular, achei que devia ser engano seu nome estar lá.

Mas o que dói mesmo, o que não tem justificativa, é defender o governo para defender seu emprego. Sim todos precisamos trabalhar, mas a ética tem que estar acima de tudo. Assim, meu caro, você se iguala a todo e qualquer político que utiliza o bem público em benefício próprio. Iguala-se àqueles que fazem coligações nojentas para garantir mais um mandato. Não era o CEP 20000 que estava em jogo naquele momento, era o futuro do Rio de Janeiro.

Seria mais digno, até, se você afirmasse que concorda com a ideologia da cidade empresa, do Eike, do prefeito, etc.

De toda forma, você terá mais 4 anos para se arrepender, espero que não seja tão amarga a experiência, quanto o foi para nós, ver lá o seu nome.

Um pesadelo


Tive um pesadelo. Acordei assustada, suada, trêmula.

Sonhei que andava pelo Rio. Não sei por que, mas eu ia pela Nossa Sra. de Copacabana. Comecei a achar tudo muito estranho! O comércio estava fechado e a rua vazia. Dos letreiros das poucas lojas ainda com ares de que funcionavam, pendiam, “meio-soltos-meio-presos”, plásticos pretos esvoaçantes.  Mesmo assim o comércio que parecia ainda ativo era restrito à cabeleireiros, veículos imobiliárias e cerveja, todos com o mesmo nome começando com X. O asfalto era muito liso mesmo, e por ele não passava ninguém.  Reparei que os prédios mais antigos sem portarias com grades modernas, portas de vidro, garagens eletrônicas e etc, aquelas portarias normais, mais antigas, comuns em Copacabana, tinham, todas, faixas como as da Defesa Civil, impedindo a entrada. Foi quando me dei conta de que não havia mais uma única palavra na rua em português.

Olhei o termômetro, marcava o equivalente a 22º C, mas em fahrenheit. No entanto, o ar era pesado. Difícil de respirar. Resolvi seguir pelo calçadão. Os prédios da Av. Atlântica eram, sem exceção, hotéis. Mas estavam decadentes como uma daquelas cidades fantasma norte americanas. Não estavam depredados, apenas abandonados. Senti um alívio ao conferir q o mar ainda estava lá embora não fizesse qualquer som. As ondas iam e vinham, continuamente, em silêncio. Não havia pessoas na praia, nem no calçadão, nem na ciclovia. Os postos eram postos da PM e os quiosques mini Q.G.s da Guarda Municipal, mas não dava para ver se havia alguém lá dentro.

Lá longe... avistei algo que parecia se movimentar.  Fiquei dividida entre o medo e a alegria de ver alguém. Apertei os olhos tentando focalizar. O movimento era rápido. Depois de uma curva vi que eram dois os objetos não identificados. Mais medo, mais alegria.  Conforme se aproximavam, notei que eram duas bicicletas. Eram dois guardas municipais, aos quais, no Rio, apelidamos carinhosamente de “municipelas” numa referência ao caráter “pela saco” de suas funções.

Quando me viram, pararam. Como tudo estava tão irreconhecível, pensei que me dariam a notícia de um grande cataclisma. Imaginei que me levariam a um dos quiosques – QGs, e me encaminhariam ao local onde estariam os demais sobreviventes. Quando se aproximaram, olharam para mim de cima a baixo. No sonho eu ia ou voltava do trabalho. Estava com a camisa da empresa, jeans e tênis, como sempre. Perguntaram meu nome e respondi. Pediram meu RG e eu dei. Foi aí que um deles sacou as algemas e veio, abrindo-as, na minha direção.

- Mas o que é isso?! – Perguntei indignada quando ele começou a me algemar. Procurei o nome na farda, não havia nenhum.
Ele respondeu que eu estava sendo presa. Quis saber por que. Eles se entreolharam e, em seguida, o que estava quieto até então, disse com ar de deboche:
- Ela que saber por que... Olha aqui garota, eu não tenho que te explicar nada, mas eu vou quebrar teu galho. Você tá toda errada!
-Como assim? Não fiz nada que não devesse, não deixei de fazer nada que fosse minha obrigação.
- A senhora está desrespeitando diversas portarias da Sec. De Ordem Pública! Pra começar, a senhora está em horário comercial de tênis, jeans e camiseta. Trajes despojados só são permitidos no Rio de Janeiro de 2ª a 6º feira de quatro às seis da manhã ou após às 18h. Nos sábados de quatro às nove e após às 16h e, só aos domingos, é liberado. Além disso, a senhora não está com a unha feita e não passou nem um corretivo nessas olheiras... o que também é uma violação da portaria que versa sobre o asseio do cidadão carioca. Pelas unhas imagino que a senhora que não está com o seu CCRS em dia.
- CCRS?
- Em que mundo a senhora vive? A senhora não tem um Cartão de Cadastro de Revisão de Salão? Aquele que atesta que a senhora tem cumprido a lei e ido ao salão regularmente toda semana faz unha, sobrancelha e corta o cabelo de três em três meses.
- Não.
- Ih! Ubirajara, a moça nem tem o CCRS! Tu vai ficar trancada um tempo, minha filha!  E deu sorte que nós te paramos antes que cruzasse para Ipanema...
- Desculpe, mas eu não estou entendendo...
- Ué?! Para mudar de bairro não pode ir a pé. Tem que ir de ônibus, van, táxi ou metrô. Ou de carro, né?
- E bicicleta?
-Bicicleta só a Guarda Municipal tem licença para usar, e só aqui na ciclovia. 

Da forma repentina como as coisas são nos sonhos, surgiu uma viatura e dois PMs. Dentro da viatura a caminho da prisão, meus olhos atentos continuavam a observar a estranha cidade.  Passamos pelo Leblon e só lá havia vida nas ruas. Mas ainda assim era esquisito. Uma gente muito loura, alta, de olhos claros que falava uma língua muito estranha, ou várias, sei lá.

Seguimos pela Barra onde o clima de abandono, de desterro era o mesmo.  Fizemos um caminho louco, mas uma série de ruas tinha mudado de mão ou foi fechada com cancelas.
Depois de muito tempo, chegamos ao destino final. O estádio Mário Filho era a o oposto do resto da cidade: novo, porém depredado. Saltando do carro, o cheiro parecia horrível e o burburinho era mais alto que em dia de final do brasileirão.

Lá dentro, passei por todo o processo normal de chegada de um novo preso. Adentramos o campo onde eu passaria alguns anos e eu, finalmente, entendi onde estava a população que tinha sobrado na cidade.


Let's go party!




Já andei me manifestando no FB sobre a onda das "partys". Acho muito sem graça e... cafona mesmo, ficar chamando festa (ó que palavra gostosa de pronunciar!) pelo seu similar em inglês. Mas enfim, contrariamos a máxima em que o colonizado ao ser consciente da colonização já está mais livre...

E insisto em algo, que também já disse em outras oportunidades, os “povos do Norte”, cada um à sua maneira, tem coisas bacanas que podíamos copiar. Mas, não. Insistimos em importar o lixo. E esse parecer ser o caminho que as “partys” têm seguido.

Dentre aqueles que trabalham com esse tipo de evento, o debate trazido pela revista de O Globo nesse último domingo (21/10) não surpreende. Essa questão já está posta e há basicamente duas linhas de pensamento. Aqueles que produzem por, digamos, amor à arte, pelo prazer e claro, pela grana, afinal ninguém trabalha de graça. Esse é um grupo que resiste à “tendência” dos “drink games” (ops! Mais uma em idioma estrangeiro...). Para eles se a principal atração da noite é o consumo, mais do que excessivo, obsessivo de álcool, melhor é pendurar as chuteiras e encontrar outra atividade.

Quando eu era adolescente, festas em que o objetivo maior era beber a ponto de vomitar ou desmaiar tinham nome e público definido, eram as micaretas. As festas que recebiam a qualificação de “alternativas”, eram aquelas onde se ouvia o que não tocava nas pistas tradicionais da cidade.  O principal era a música boa, muitas vezes ao vivo, dançar e também tomar uma cerveja, por que não? Claro, que muitas vezes as pessoas passavam do ponto. Mas ninguém saía de casa com esse intuito.

Graças a isso ritmos tradicionais como o forró foram resgatados, revisitados e fizeram um monte de gente redescobrir as danças a dois. Ponto pra cultura nacional! Outros espaços se mantiveram abertos, mesmo que reduzidos, como é o caso dos diversos estilos de rock. Há, felizmente um grupo para o qual o principal compromisso é a difusão da cultura, o prazer da boa música, conversa... e do sexo oposto, da cervejinha, etc. Uma coisa não tem, nem deve, excluir a outra.

Para muita gente a matéria de ontem foi um “desabafo”. Que bom.

Ah! O Carnaval!


A lacuna deixada desde sempre pelo poder público nos bolsões de miséria ao qual nos acostumamos chamar favelas e que, no tão em moda universo politicamente correto, denominamos “comunidade”, abriu espaço para um poder paralelo. Reconhecido e legitimado pelo Estado e pela sociedade, nós também, é claro. À essa conivência, batizamos “carnaval carioca”.

Não há como ser politicamente correto e conviver com o fato de que há seres humanos, algumas vezes até trabalhando para você, vivendo nessas condições. Ou há? Além disso, quando os denominamos comunidade nos diferenciamos dessa massa amorfa: o povo. Quem somos nós, então? A nobreza encastelada?  Ou aquela velha burguesia burra que “assiste a tudo de cima do muro”?
Passamos o ano reclamando da violência, dos abusos e desrespeitos do Estado, da impunidade. Até que a “alegria infernal” vem chegando de mansinho com os ensaios e, aos poucos toma a Avenida... à qual nos referimos como Sapucahy. Uma referência ao Marquês que dá nome à rua, mesmo que a passarela em si chame Prof. Darcy Ribeiro, um título bem mais interessante.

Assistimos então, a maioria pela TV, bestializados, ao belo espetáculo do dinheiro público alimentando o crime sem qualquer prestação de contas. Chamamos as escolas de São Paulo de “mafiosas” por estarem ligadas às torcidas organizadas que, volta e meia, ocupam as páginas policiais, assim como nossos bicheiros. E nem percebemos o absurdo da ideia. Se prestasse contas, o crime – por que é essa a verdade – continuaria recebendo dinheiro e tudo bem?

Mas há o outro lado dessa história. Há os “barões famintos”, “napoleões retintos” e a “alegria fugaz” a quem têm direito. Como tinham os escravos de beber cachaça e celebrar seus orixás dentro das senzalas. O povo mais uma vez, essa massa amorfa, vira atração turística. Recebe, em troca dos milhões “em dinheiro” que produz, com seu esforço – E por que não, força de trabalho - o benefício de ser o protagonista da noite. E, quem sabe, aparecer na TV, no VT ou no DVD.

E nós, seguimos sambando e cantando junto, de casa, achando a festa democrática. A D. Cleuza, costureira, que torna realidade a fantasia, literalmente, não vê metade dessa grana que é movimentada pelos responsáveis pelo carnaval. No entanto, o movimento que o carnaval gera no bolso dela, já faz uma grande diferença para ela. Faz para muita gente.


Mas voltando ao raciocínio inicial, a discussão acerca da censura ou não dos enredos, e seu tema subsequente, que é o carnaval das escolas do Rio ser dirigido por criminosos. O que deve ficar claro, é que essa discussão só faz sentido numa cidade em que o crime tem relações diretas com o poder público. Em que o Estado não está presente de forma socialmente sustentável. Se assim fosse as agremiações não precisariam ser geridas por senhores bicheiros e tocada pelos servos que trabalham em troca de algum dinheiro e por laços de fidelidade. O crime e o governo do Rio de Janeiro estabeleceram uma PPP (parceria público privada) para os eventos internacionais que virão. Mas com relação ao carnaval, a parceria é antiga. Dinheiro público investido em cultura tem que oferecer algum retorno de valor cultural real à população.

E muita gente comemora a segurança e a elitização da cidade que se traduz em catracas nas trilhas, valorização dos imóveis, etc. Pagam felizes os royalties desses megaeventos.  Enquanto seguem reclamando dos blocos que se sustentavam sozinhos... E que também já estão se tornando outra coisa... O carioca ama a escola em que, muitas vezes nunca passou perto. E, também por isso, prefere ignorar todas as relações entre o desfile e o crime. "Deixa passar essa, é pelo carnaval!"

Enquanto isso o negócio do carnaval aprofunda-se nas piores características que  termo possui. Entraram em cena definitivamente as empresas e com isso. Entram com elas os enredos bizarros.
Ninguém mais lembra dos sambas...