sexta-feira, 19 de abril de 2013

Ah! O Carnaval!


A lacuna deixada desde sempre pelo poder público nos bolsões de miséria ao qual nos acostumamos chamar favelas e que, no tão em moda universo politicamente correto, denominamos “comunidade”, abriu espaço para um poder paralelo. Reconhecido e legitimado pelo Estado e pela sociedade, nós também, é claro. À essa conivência, batizamos “carnaval carioca”.

Não há como ser politicamente correto e conviver com o fato de que há seres humanos, algumas vezes até trabalhando para você, vivendo nessas condições. Ou há? Além disso, quando os denominamos comunidade nos diferenciamos dessa massa amorfa: o povo. Quem somos nós, então? A nobreza encastelada?  Ou aquela velha burguesia burra que “assiste a tudo de cima do muro”?
Passamos o ano reclamando da violência, dos abusos e desrespeitos do Estado, da impunidade. Até que a “alegria infernal” vem chegando de mansinho com os ensaios e, aos poucos toma a Avenida... à qual nos referimos como Sapucahy. Uma referência ao Marquês que dá nome à rua, mesmo que a passarela em si chame Prof. Darcy Ribeiro, um título bem mais interessante.

Assistimos então, a maioria pela TV, bestializados, ao belo espetáculo do dinheiro público alimentando o crime sem qualquer prestação de contas. Chamamos as escolas de São Paulo de “mafiosas” por estarem ligadas às torcidas organizadas que, volta e meia, ocupam as páginas policiais, assim como nossos bicheiros. E nem percebemos o absurdo da ideia. Se prestasse contas, o crime – por que é essa a verdade – continuaria recebendo dinheiro e tudo bem?

Mas há o outro lado dessa história. Há os “barões famintos”, “napoleões retintos” e a “alegria fugaz” a quem têm direito. Como tinham os escravos de beber cachaça e celebrar seus orixás dentro das senzalas. O povo mais uma vez, essa massa amorfa, vira atração turística. Recebe, em troca dos milhões “em dinheiro” que produz, com seu esforço – E por que não, força de trabalho - o benefício de ser o protagonista da noite. E, quem sabe, aparecer na TV, no VT ou no DVD.

E nós, seguimos sambando e cantando junto, de casa, achando a festa democrática. A D. Cleuza, costureira, que torna realidade a fantasia, literalmente, não vê metade dessa grana que é movimentada pelos responsáveis pelo carnaval. No entanto, o movimento que o carnaval gera no bolso dela, já faz uma grande diferença para ela. Faz para muita gente.


Mas voltando ao raciocínio inicial, a discussão acerca da censura ou não dos enredos, e seu tema subsequente, que é o carnaval das escolas do Rio ser dirigido por criminosos. O que deve ficar claro, é que essa discussão só faz sentido numa cidade em que o crime tem relações diretas com o poder público. Em que o Estado não está presente de forma socialmente sustentável. Se assim fosse as agremiações não precisariam ser geridas por senhores bicheiros e tocada pelos servos que trabalham em troca de algum dinheiro e por laços de fidelidade. O crime e o governo do Rio de Janeiro estabeleceram uma PPP (parceria público privada) para os eventos internacionais que virão. Mas com relação ao carnaval, a parceria é antiga. Dinheiro público investido em cultura tem que oferecer algum retorno de valor cultural real à população.

E muita gente comemora a segurança e a elitização da cidade que se traduz em catracas nas trilhas, valorização dos imóveis, etc. Pagam felizes os royalties desses megaeventos.  Enquanto seguem reclamando dos blocos que se sustentavam sozinhos... E que também já estão se tornando outra coisa... O carioca ama a escola em que, muitas vezes nunca passou perto. E, também por isso, prefere ignorar todas as relações entre o desfile e o crime. "Deixa passar essa, é pelo carnaval!"

Enquanto isso o negócio do carnaval aprofunda-se nas piores características que  termo possui. Entraram em cena definitivamente as empresas e com isso. Entram com elas os enredos bizarros.
Ninguém mais lembra dos sambas...

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